SABATINA
OU INQUISIÇÃO?
René Ariel Dotti
A
resistência heroica do Professor e Advogado Edson Luiz Fachin contra juízos
temerários alimentados pelo preconceito de idéias e intolerância de convicções
tem sido enfrentada com paciência beneditina e o vigor dos grandes espíritos.
Sua pretensão de servir ao nosso país com o patrimônio intelectual no Brasil e
no exterior que conferem, sem qualquer favor, no campo jurídico nacionalmente
reconhecido não está em discussão pois é imensamente notório e Por isso volto à
nossa luta que é fraternalmente partilhada com inúmeros cidadãos de nosso país.
a Causa Fachin contra o obscurantismo e a intolerância que são incompatíveis em
uma casa de leis no Estado Democrático de Direito.
Tenho
confiança na prudência e na capacidade de avaliação dos Senadores da República
que, certamente, não farão da sessão nobre de uma sabatina sobre
a condição humana, social, política, intelectual e espiritual de um
candidato a juiz, num simulacro de inquisição de Tribunal do Santo
Ofício, com as mais variadas acusações para a excomunhão de apóstatas e
hereges.
Galileu Galilei (1564-1642), o imortal matemático, físico e
astrônomo italiano, foi o verdadeiro fundados da ciência experimental na
Itália. Entre as suas principais pesquisas e Descobertas levaram-no a adotar o
sistema do mundo proposto pelo astrônomo Nicolau
Copérnico ( 1473-15430) conforme a teoria heliocêntrica do sistema
solar. Galileu defendeu aquela tese proclamando que o centro do mundo
planetário era o Sol e não a Terra. Mas foi perseguido por aquela tese pelos
escolásticos e pela Cúria romana que declararam ser herético o sistema de
Copérnico. “Intimado a abandonar a sua doutrina, Galileu acedeu a tudo que lhe
quiseram impor, mas de volta a Florença reuniu num livro (1632), todas as
provas da verdade do sistema. Essa obra foi denunciada à Inquisição e Galileu,
então septuagenário, teve, para escapar à fogueira, de abjurar, de joelhos,
perante aquele tribunal a sua pretendida heresia (1633)”.
Fonte: Dicionário Prático Ilustrado,
publicado sob a direção de Jaime de Sèguier, em edição atualizada e
aumentada por José Lello e Edgar Lello, Porto (Portugal): Lello & Irmão-
Editores, 1973, p. 1629.
Mas na mesma
obra se encontra o seguinte: “ E pur si muove!” (“E contudo ela
move-se”). Palavras italianas, que se diz ter Galileu pronunciado, depois de
haver sido obrigado pelo Santo Ofício a abjurar a pretendia heresia de que a
Terra girava sobre si mesma no espaço” (p. 1301)
Felizmente,
porém, não estamos mais no tempo das devassas produzidas pelos regimes
autoritários religiosos, militares ou qualquer governo de força. No Brasil de
hoje, cuja Constituição consagra liberdades públicas, direitos e garantias
individuais; que garante que “ninguém será privado de seus direitos por
motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo de a
invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a
cumprir prestação alternativa, fixada em lei” (art. 5º, VIII, do Título II dos direitos e garantias fundamentais)
A mesma Carta Magna, traz no
preâmbulo a afirmação de que os representantes do povo brasileiro,
“reunidos em
Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático,
destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a
liberdade, a segurança, o bem- estar, o desenvolvimento, a igualdade e a
justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e
sem preconceitos, fundada na ordem interna e internacional (...)
Quais
são as exigências constitucionais para o exercício do cargo de Ministro do
Supremo Tribunal Federal? 1ª. A cidadania (brasileira); 2ª
a idade superior a trinta e cinco e inferior a sessenta e cinco anos;
3ª Notável saber jurídico; 4ª Reputação ilibada.
Faltam
ao cidadão e mestre de Direito Edson Luiz Fachin algum ou alguns desses
requisitos? Obviamente não!
A
discussão pública sobre a candidatura limita-se, apenas, a indagar sobre o
último pressuposto, uma vez que o saber jurídico não encontra nenhuma objeção
como é público e notório. A imensa documentação da comunidade jurídica
nacional e internacional atesta-o soberanamente.
Faltaria
a ele a reputação ilibada? O que significa
“reputação ilibada?” Os dicionários conceituam a palavra “ilibada”,
como sinônimo de “1 não tocado; sem mancha; puro 2 que ficou livre de
culpa ou de suspeita; reabilitado, justificado” (Houaiss).
A única
objeção que seria apresentada com base em
parecer do analista Dr. João
Trindade Cavalcanti Filho, solicitado por um ilustre Senador do PMDB,
afirmando ilegalidade na advocacia privada em conflito com o cargo de
Procurador do Estado do Paraná, foi devidamente neutralizada pelo Consultor
Legislativo Fernando Trindade à luz
da Constituição Federal, da legislação específica sobre impedimentos e
incompatibilidades para a advocacia (Lei nº 8.906/1994) e reiteradas decisões
do Conselho Federal da OAB demonstrando, exaustivamente que não há nenhum óbice
para o reconhecimento da reputação ilibada do candidato Fachin. Vale
transcrever parte da conclusão afirmando a “inexistência de incompatibilidade, embora a
restrição de advogar contra a no
período em que foi procurador do Estado do Paraná, pelas razões acima
arroladas, em especial no item V, o nosso entendimento é o de que tal exercício
encontra amparo no ordenamento jurídico do País, em especial na Constituição
Federal, não se revestindo de ilegalidade” (Documento circulando em redes
sociais)
Não
posso acreditar que o Senado incorpore o espírito de Joseph Mc Carty. Não para
perseguir comunistas (isso já passou de moda); Mas se pretender decidir um
assunto que tem natureza legal a defeituosa interpretação poderá criar um
terrível erro parlamentar. Bem mais grave que o erro judiciário.
Porque a vítima deste, cumprida a pena e obtida a reabilitação mediante condições
legais, além da indenização devida pelo Estado, poderá voltar ao convívio
social sem sofrer a pena de rejeição.
Mas
um honrado cidadão e mestre reconhecido de Direito, reprovado pelo Supremo
Tribunal por indignidade ao cargo irá purgar uma irrecorrível e eterna
sentença. Será a segunda recusa na história do Judiciário brasileiro após um
século.
Onde a culpa para autorizar a maldição
desse julgamento que ressuscitando a liturgia fantástica lembra:
“A outra
vertente do impacto político das
Inquisições diz respeito ao papel dos tribunais da fé, apesar deles e contra a
sua vontade, no processo da criação de um novo sistema de valores. Com efeito,
as inquisições utilizaram seus ritos mais ostentatórios, como o do auto da fé,
para se afirmar como pilar da Igreja militante, principal impedimento à
conquista da fortaleza sediada pelos hereges. Esse gênero de retórica,
utilizado nos sermões, era sublinhado pelos atos de imposição da penitência e
do castigo, expondo em público milhares e milhares de condenados. É justamente
essa operação constante de propaganda do triunfo contra a heresia que se volta
contra as próprias Inquisições”. Fonte: Bethencourt, Francisco. História das
Inquisições - Portugal, Espanha e Itália: Séculos XV-XIX, São Paulo:
Companhia das Letras, 2000, p. 410.
Luiz Edson Fachin não é candidato ao
cargo de Imperador para mudar a
Constituição e o regime do nosso país como se o alto colegiado do
Supremo Tribunal Federal pudesse ficar refém (?!!!)de ações totalitárias que
nunca foram praticadas ou defendidas pelo Professor e Advogado Fachin. Ele não
deve e nem precisa ajoelhar-se em um Auto
de Fé e de Expiação perante o augusto Senado da República brasileira, que num tempo de liberdades
públicas, direitos e garantias individuais não está a procura de hereges de
doutrinas oficiais e não é parceiro da intolerância. Os rastilhos da intriga,
distribuídos como material de combustão para acender uma grande e luminosa
fogueira irão desaparecer com a Verdade e a Justiça de quem se propõe a assumir
a missão mais importante de sua vida.
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René
Ariel Dotti (15.11.1934). Advogado nas áreas criminal e de família desde
1958 •• Professor Titular de Direito Penal, por
concursos: Auxiliar de Ensino (1966); Assistente (1970); Adjunto (1979) e
Titular (1981) •• Comenda
do Mérito Judiciário do Estado do Paraná •• Secretário de Estado da Cultura
do Paraná (1987-1991) •• Medalha do Mérito Legislativo,
da Câmara dos Deputados por proposta do Deputado Osmar Serraglio (2007), “como
reconhecimento pelos relevantes serviços prestados ao Poder Legislativo e ao
Brasil” (Membro de comissões de reforma do sistema penal (1979 a 2000)
constituídas pelo Ministério da Justiça •• Corredator
dos projetos que se converteram nas Leis 9.209 e 9.210/1984 (Reforma da Parte
Geral do Código Penal e instituição da Lei de Execução Penal) ••Redator do Anteprojeto de Reforma do Tribunal do
Júri (Lei nº 11.689/2008 •• Condecorado com a Medalha Tenente Max Wolff Filho da Legião Paranaense do
Expedicionário (20.02.1988) •• Prêmio Ordem do Mérito Judiciário do Trabalho, conferida pelo
Tribunal Superior do Trabalho, como uma das personalidades civis de 2014 ••
Medalha
Santo Ivo - Padroeiro dos Advogados, conferida pelo Instituto dos
Advogados Brasileiros, por ocasião da XXI Conferência Nacional da OAB
(Curitiba, nov. 2001 )•• Homenagem do Conselho Federal da OAB,Comissão
Parlamentar Memória, Verdade e Justiça e a Comissão de Constituição Justiça e
Cidadania da Câmara dos Deputados, em sessão pública de 13.11.2014, “pelos
serviços advocatícios prestados na defesa de presos e perseguidos políticos na
ditadura militar” •• Homenagem do Conselho Federal
da OAB “em reconhecimento aos relevantes serviços desenvolvidos na defesa dos
direitos civis e na luta pela redemocratização do Brasil, por ocasião da
passagem do cinquentenário do Golpe Militar” (31.03.2014) •• Presença (foto e texto) no livro
“Coragem: A Advocacia Criminal anos de Chumbo”, Org. Deputado José Mentor, iniciativa
OAB-SP ••
Depoimento no livro “Advocacia em tempos difíceis: Ditadura Militar, 1964-1985”, realização da FGV, coordenação
Paula Spieler e Rafael M. R. Queiroz ••
Vice-Presidente Honorário da Associação Internacional de Direito Penal,
com sede em Paris, desde 1924 •• Demais créditos e homenagens
em www.dotti.adv.br e www.professordotti.com.br